sexta-feira, 15 de julho de 2011

GRATIDÃO

Ali, naquele mesma praça, encontrei Dona Mocinha: vivida, sofrida, avançada. Como dizem, evoluída. Há pessoas que parecem ter passado por um punhado de vidas numa só. Era Dona Mocinha! Já havia passado dos 80 – a data exata não contava nem sob tortura – andava de tênis e bengala, que facilmente esquecia, ali mesmo, no primeiro lugar que encostasse. É que não precisava dela: “Era só para garantir... Só porque os filhos queriam”.

Havia um brilho naqueles pequenos olhos apertados, coisa que não se vê em olhos recentes. O segredo?
- Sempre disse tudo o que pensei, meu filho. Nunca economizei palavra!

Mas, claro que não era só isso.

Também jogava carteado com as amigas toda segunda, bebia caipirinha com os amigos toda terça, ia à igreja com o grupo de reza toda quarta, freqüentava assiduamente o cabeleireiro toda quinta (pra lavar, entende?), fazia unha toda sexta, e se empirulitava no shopping com a turma todo sábado. Domingo? Para os filhos, netos, bisnetos, tataraneta, sobrinhos, e todo mundo que enchia a casa de alegria para sair encharcado de alegria. Da dela, é claro!

Era assim, Dona Mocinha. Sempre que escapava à investigação dos parentes, ia para onde queria, fazia só o que queria, concedia apenas as satisfações mínimas necessárias dos próprios atos, quando queria. Ah, e nunca mais se casou, depois que o finado fez a passagem. Porque “Casamento é um só”, dizia. “Se foi bom, não repita; se não foi, passe longe. E ta bom assim!”

Faltou um item. O maior de todos. Dona Mocinha nunca economizou do amor que deu.
- Água e amor não se oferecem, a gente dá. E não economize, viu!
Para aquela “mocinha”, gratidão era o que a fazia viver.

Dona Mocinha foi isso: uma figura. Fazia valer cada letra de uma frase que ela mesma copiou de um pára-choque de caminhão: “O preço de uma coisa é o quanto de vida se dá em troca.”

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