quarta-feira, 14 de setembro de 2011

DIVÃ 11

Falei, ali atrás, da “bela alma”, e esqueci-me de dizer que tudo se resume ao que uma amiga diz: “Todo hábito de freira esconde um espartilho vermelho”. A “bela alma” tenta esconder demônios preocupantes. Mas eles existem. E aí, quando ela vem para a análise, e a análise desperta esses demônios adormecidos, meu Deus, o que fazer?! Não era melhor que continuassem adormecidos? Depende. Depende de como o sujeito pretende que seja esse “adormecer”: uma porque demônio não dorme; outra, porque você não dorme; terceira, porque se o hábito de freira for branco, o espartilho vermelho vai aparecer. Ah, se vai!

Falo isso, porque, geralmente, na análise como na vida, não existe “bandido”. Só “mocinho”. Cada um traz no embornal a certeza de que ele é bom e o resto do mundo nem tanto assim. Lembro-me do papai quando dizia: Todo mundo é muito bonzinho, mas as minhas galinhas tão sumindo todas!

Então, o que a análise faz? Ela questiona o mocinho embutido no bandido. Será que a gente é mesmo assim tão mocinho quanto almeja parecer? Não será mais inteligente considerar que todo mocinho esconda um bandido, todo hábito de freira um espartilho vermelho?

Mas é tão complicado questionar o “mocinho”! Desvendar o espartilho sob o hábito, então, nem se fale!

Um sujeito, certa vez, me pediu que eu não lhe devolvesse apenas o que ele dissesse, que não só regurgitasse aquilo que ele havia falado, segundo ele, “que nem criança regurgita queijinho!” E completou: Se for para ficar apenas no “Ah! Que ruim que aconteceu isso com você”, então vamos pro bar, beber. No lugar do analista, dizia ele, se espera que o analista não fique perdido na cortina de fumaça do paciente! O analista tem de dizer “sim” se for sim, “não” se for não, e, às vezes, “siiimmm” e, às vezes, “nãããooo”!

Falo isso, porque não é raro o sujeito pegar a barda de se esconder atrás dos sintomas. “É a minha psoríase”, “é a minha depressão”, “é a minha ansiedade”, “é a minha enxaqueca”... Mas esses são os seus sintomas, falo sempre pro dono deles. Cadê você? Quem é você? O que o traz aqui? O que faz você viver? E o que o impede? Por que você não voa com asas que tem? Que dependência é essa de que o outro vá para você poder ir? Que dependência é essa de que o outro queira pra você poder querer? Por que se esconder tanto atrás de uma imagem se você nem sabe direito como ela é?

Entende?

Um comentário:

  1. Mais uma análise brilhante Renato,com certeza atras da bela imagem que aparentamos,mora um dragão adormecido...A questão é, se o Dragão acordar teremos força p/dominá-lo, eis a questão!

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