quarta-feira, 12 de outubro de 2011

LÁZARO, SAI DESSA, RAPAZ! – 5

E Jesus gritou com voz forte: Lázaro, vem para fora! E o morto saiu, tendo mãos e pés amarrados com faixas, e o rosto envolto num sudário. Disse-lhes Jesus: Desliguem-no e deixem-no ir. (João 11,43-44)

Um caso de melancolia numa casa de Betânia
João 11



Lázaro foi um caso de amor. O amor é sempre transferencial. Uai, que novidade é essa: amor transferencial?

Amor transferencial é uma forma de amor, mas é, também, uma ferramenta de trabalho. Trata-se de um fenômeno que surge espontaneamente na clínica, no encontro entre paciente e analista. Freud batizou esse fenômeno de “transferência”. O paciente vive com o analista uma espécie de amor que, em tudo, repete maneiras antigas, moldes anacrônicos de amar. Mas, amar o quê, a quem? Ora, só duas pessoas são os modelos originais da vida: pai e mãe. O resto é cópia. Pela vida afora, o que você fez foi repetir o jeito como amou e se sentiu amado por aqueles modelos originais da vida. São os moldes primeiros do amor. E eles retornam dessa forma, nisso que se chama transferência. Não importa quem ocupe aquele lugar. Pode ser o analista, o médico, o professor, o padre, o tio, ou qualquer outra figura, e tudo isso no feminino também. São os objetos de amor, as maneiras com que cada um construiu a sua marca registrada de amar: uma espécie de impressão digital do amor.

Numa família, pode haver muitos irmãos. Não importa! Cada um vai amar de um jeito, viver de um jeito, existir do seu jeito. Quando chegar a hora, cada um vai morrer do seu jeito. Na vida e na morte, cada um é absolutamente ele mesmo. No entanto, a existência vai recortando moldes e imprimindo em cada um a sua tipografia gráfica. Nesse sentido, cada sujeito humano nasce original e morre cópia. Estamos sempre repetindo, cada um a seu modo e na sua originalidade, porém, repetindo. Pode conferir por aí: só existem duas ou três histórias humanas diferentes, que se repetem furiosamente, como se nunca tivessem existido antes.

Esse é o amor transferencial. Mas se for assim, afinal, que amor não é transferencial?

Foram esses amores, os mesmos, que tornaram plena a vida daquela insólita família de Betânia e daquele hóspede singular. O capítulo 11 de João nos mostra, a quente, a intensidade de uma relação de amor transferencial, transbordando em Marta, Lázaro e Maria.

Agora, se essa história de “amor transferencial” parecer complicada demais para você, então, mude os termos. Jogue fora o adjetivo “transferencial”. E fale apenas de amor. Afinal, era isso que eles sentiam por Jesus e Jesus por eles. Era uma relação de amor. Com todas as letras, escritas, sublinhadas e piscando em néon colorido.

Os três amavam Jesus. Como amavam! Amavam demais. E ele tinha tudo pra ser amado, demais. Né! Se você estivesse lá, se vivesse em Betânia, acho que amaria, demais, também.

E Jesus correspondia àquele amor. Demais? Não acho difícil responder que demais, sim. Até porque é muito provável que ele não soubesse amar... de menos. Não tem a cara dele fazer coisa que seja de menos.

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