quinta-feira, 6 de outubro de 2011

LÁZARO, SAI DESSA, RAPAZ! - 2

“Senhor, aquele que amas está astenon” (João 11,3).

“Aquele que amas”, naturalmente, não é uma expressão qualquer. Amor é uma palavra para ser pronunciada pausadamente. “Aquele que amas” deveria ser provavelmente o sujeito com quem Jesus continuasse a conversa de mil anos atrás como se tivesse interrompido ontem. É que o amor faz parte da eternidade. Lázaro, Marta e Maria eram amados por Jesus. Eram “filei”, amigos íntimos, não qualquer um, nem qualquer pessoa, mas apenas aquelas que cabem nos dedos de uma mão.

Lázaro, Marta e Maria: amigos íntimos de Jesus.

Mas será que existiram, realmente? Sim e não, não e sim. Depende do ângulo em que você olhar. É sobre esse ângulo que pretendo conversar com você.

Essa história encontra-se no capítulo 11 do Evangelho de João: o texto da ressurreição de Lázaro. Seria bom ler o texto, para conhecer o enredo de antemão. E a primeira coisa, a saber, a respeito do capítulo 11 é que ele não foi escrito nem agora nem para você. Ele só fará sentido em vista de um outro texto, escrito no tempo quando os campos do Senhor ainda eram verdes.

"Jesus fez muitos outros sinais que não estão escritos neste livro. Estes sinais foram escritos para que vocês creiam...” (João 20,30-31)


É assim que termina o capítulo 20 do evangelho de João. O evangelho de João tem 21 capítulos, mas o capítulo 21 foi anexado 200 anos depois. Na verdade, o texto original, escrito no final do primeiro século, termina no capítulo 20, com essas palavras que copiei acima. O que significa que...?

Voilá! Temos uma pista. Quem quer que tenha escrito o Evangelho de João deixou pistas, “sinais” pelo caminho, placas sinalizadoras para orientarem o caminho. Então, a primeira coisa a fazer é perguntar: onde estão essas placas? Que sinais são esses?

O evangelho de João não tem parábolas, como Marcos, Mateus e Lucas. Mesmo assim, João conta casos. Só que ele não chama os casos nem de parábolas nem de milagres (muito menos, de milagres!), mas de “sinais”, sêmeia, em grego, donde vem a palavra “semântica”. E João enumera sete sinais. Veja bem: sete! O “sinal” de Lázaro é o sétimo sinal.

Então a primeira coisa a deixar claro é essa: Lázaro é um “sinal”. É essa a primeira e mais importante observação a ser feita. Não é um milagre, como algumas traduções capengas continuam escrevendo. É um sinal. E o que faz um sinal? Um sinal sinaliza. Apenas isso. A placa da estrada que informa “BRAZÓPOLIS 5 KM” não é Brazópolis. É só a placa de estrada. Toda a estonteante beleza arquitetônica e urbanística de Brazópolis, oitava maravilha do mundo moderno, não caberia dentro de uma placa. Placa não é a realidade da coisa. É só um sinal.
Monet pintou um quadro de uma mulher verde. Disseram para ele: Não existe mulher verde. Ele respondeu: Isso não é uma mulher, é um quadro. Sinal não é a coisa. Sinal é sinal de alguma outra coisa. Do quê? Sei lá! O que eu sei é que, aqui, o que eu tenho é só um sinal. Lázaro é (só) um sinal.

Outro dia, um sujeito me disse que havia visitado a casa de Lázaro em Betânia. Eu quase respondi: Perdoe-me desmanchar as fantasias da sua inocência batismal, mas Lázaro não existiu. O que existe de Lázaro é o que está escrito dele. Lázaro é (só) um sinal. Mas é um sinal eloquente de uma realidade muito maior. Se essa realidade não cabe nem nas palavras, que dirá numa casa!

Por que a gente precisa tanto do concreto, se é o simbólico que nos fez humanos?

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