domingo, 22 de janeiro de 2012

SÍNDROME DO PÂNICO (2)

Mas o que ocorre numa Síndrome do Pânico? Melhor: o que se esconde numa Síndrome do Pânico?

Para entender essa questão, é preciso ir à base do edifício humano.

Parêntesis. Dia desses, um sujeito chegou, entrou, sentou e me disse: “Vim aqui, mas não quero falar nem do meu pai nem da minha mãe.”
- Resposta número 1: Então, ta! Tchau!
- Resposta número 2: Você mesmo já falou!
- Resposta número 3: Quem você eliminaria do BBB?
Qual das três você acha que eu empreguei na ocasião? (... ... ...) Errou! Simplesmente, fiquei quieto e esperei que ele mesmo se desse conta da inadequação da própria postura. Sorte minha: ele era inteligente! Foi só um escorregão.

Na base do edifício humano, encontramos duas sensações fundamentais, sem as quais um dia a casa cai: previsibilidade e confiança. Um ambiente previsível e confiante garante uma experiência de continuidade na existência da criança. A falha no ambiente produz angústias impensáveis no pequeno ser. Essas angústias impensáveis produzem um colapso nos processos que deveriam estar acontecendo naquele momento: integração, personalização, contato com a realidade. A criança não sabe o que está acontecendo. Caso falte confiança e previsibilidade, só o que ela sabe é que tudo está ruim. O ambiente precisa prover que o primeiro contato com realidade mostre a ela que a vida não é ruim. Nesse processo, o quesito mais importante é, de longe, a confiança.

Uma criança saudável, que teve continuidade da existência, que se personalizou, que se integrou, a quem a realidade foi apresentada desde o início como boa, confia neste mundo. Se o mundo for estável, ela confia que ele não vai falhar. Se confiar no mundo, pode também confiar nos outros, ficar tranqüila e brincar. Mais tarde, no mundo adulto, terá uma chance muito grande de apreciar-se a si mesma, de gostar do que faz e fazer bem feito. Confiança é tudo!

Daí, a gente entende que pessoas não consigam confiar. Faltou um ambiente previsível. Ambiente previsível é aquele que não vai mudar a toda hora. Pensem numa mãe depressiva, com transtorno bipolar ou pânico. Imaginem uma mãe que abandona facilmente o pequeno ser nas mãos do primeiro que se apresentar, por ter “algo mais interessante” a participar. Imaginem uma família sem condição de oferecer previsibilidade, que muda de casa e de cidade a cada estação.

Conheci um padre que criava galinhas. O bispo o mudava tanto de paróquia, que se dizia que quando ele chegava perto das galinhas, elas erguiam as asas pra ele pegar. Mas ele era sozinho, e as galinhas não precisavam de nenhum ambiente tão previsível e confiante. Pelo menos, não como uma criança necessita.

Um ambiente previsível gera confiança. Confiança gera estabilidade. Estabilidade é o antídoto do medo. “Desenvolvendo-se num ambiente em que os cuidados maternos sejam contínuos e tenham como característica a regularidade, a monotonia, a evitação de coincidências, e onde a mãe é consistentemente ela mesma, o nenê pode permanecer por tempo suficiente num mundo subjetivo no qual o mundo da realidade externa não se intromete” (Winnicott, psicanalista inglês).

Esse ambiente torna a criança capaz de prever. A confirmação regular das suas expectativas forma a base de apoio para a confiança. A isso se dá o nome de ambiente facilitador. Facilitador do quê? Facilitador de que as primeiras experiências boas possam ser repetidas. Quais? Previsibilidade e confiança. Para quê? Para acreditar no mundo, apesar dele mesmo, e acreditar em si, apesar de si mesmo.

Nesse estágio inicial, o nenê vive na dependência absoluta da mãe. Se ele conseguir induzir a si mesmo a pensar e a crer que a mãe não vai falhar – se ele chorar e a mãe estiver ali, por exemplo – ou seja, se ele repetir a sensação de que o ambiente é previsível e confiável, ele vai crescer com confiança no mundo. Repito, apesar de o mundo não ser lá grande coisa! Mas a chance dele ficar melhor será maior se os seus habitantes planetários conseguirem confiar até mesmo na incrível capacidade dele ser melhor e na ainda mais incrível capacidade deles serem melhores.

Toda pessoa é dotada de uma tendência ao amadurecimento e à integração numa unidade. Ou seja, toda pessoa vem com um chip que proporciona crescimento afetivo ao lado do amadurecimento biológico. Mas isso depende do ambiente facilitador, isto é, de um ambiente que ofereça cuidados suficientemente bons. Se o ambiente não for facilitador, não oferecer cuidados suficientemente bons – se a mãe apenas não estiver ali quando se precisar dela e só isso – pode acontecer uma falha (diria, brincando, geológica) no psiquismo. Nessa falha, a criança vive uma angústia impensável, perde a confiança e se desintegra. Futuramente, o nome da grande desintegração poderá ser psicose. Mas há também outros nomes mais brandos. Síndrome do Pânico é um deles. Seja o que for, o pior de todos os tormentos é a incapacidade de, simplesmente, o sujeito conseguir confiar.

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