sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

KYRIE

Senhor Deus, tende piedade de mim
pois sou o pecado.

Confesso que sou humano, da terra, do solo.
No entanto, destinado a voar e a velejar com os ventos.

Confesso o pecado da idolatria: levo-me em consideração demais.

Ao meu “eu” chamo “Monarca”,
inclino-me ao altar do meu desejo,
aborreço-me com o desejo dos outros.

Confesso que não danço.
A dança cósmica é muito perigosa.
E a dança pessoal é muito reveladora.

Confesso que não rio com abandono.
Meu frágil “eu” permite apenas sorrisos apertados.

Confesso minha vaidade, meu orgulho exposto.
Minha dignidade desdenha da liberdade dos simples.

Confesso meu medo, minha angústia, minha docilidade, e o pior, minha inveja.
Meu medo é pecado: ele mascara minha ausência de fé.
Minha angústia é traição: ela revela minha falta de esperança.
Minha docilidade é deferência: ela expõe meu medo de ser livre.
Minha inveja é ácida: ela corrói o que ainda resta da caridade com que fui amado.

Confesso minha respeitabilidade.
Ponho minha imagem acima da espontaneidade e da liberdade do espírito.

Senhor Deus, tende piedade de mim,
pois sou o pecado.



Senhor Deus, tende piedade de mim,
pois sou a graça.

Em vossa graça eu nasço outra vez,
transformado, renovado, sadio.

Embora eu mal conheça a profundidade do meu pecado,
ele é tocado e abraçado,
é aliviado pelo óleo do perdão, que cura,
pelo bálsamo da misericórdia, que restaura.

Minha escuridão, vós superastes.
Minha culpa, vós desfizestes.
Minha angústia, vós acalmastes.

Senhor Deus, tende piedade de mim.

Confesso que sou o pecado. Confesso que sou a graça.

E em meu pecado, e em vossa graça, confesso que sois Deus.

E em pecado e em graça, doente ou são,
permaneço vosso amigo amado.

Um comentário:

  1. Excelente texto, Renato, claro, oportuno,questionador e inspirador.
    Abraços, Zélia

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