sábado, 19 de novembro de 2011

LÁZARO, SAI DESSA, RAPAZ! – 12

E Jesus gritou com voz forte: Lázaro, vem para fora! E o morto saiu, tendo mãos e pés amarrados com faixas, e o rosto envolto num sudário. Disse-lhes Jesus: Desliguem-no e deixem-no ir. (João 11,43-44)

Um caso de melancolia numa casa de Betânia
João 11

Marta, perdida, racionaliza. Aliás, Marta é a rainha da racionalização. Se ela levar Jesus pelo mesmo caminho, se ele ficar perdido com ela, será que isso poderá abrandar a sua dor? Se ela envolver Jesus na trama das suas racionalizações, poderá diminuir sua angústia? Parece que é o que ela pensa. Note que Marta foi a primeira a se levantar e a ir ao encontro de Jesus. É que Marta está sempre saindo, sempre fazendo, sempre indo, sempre acontecendo. Marta está o tempo todo no ar. Já Lucas sabia disso (Lc 10,38).

Mas, por que Marta corre tanto de um lado para o outro? Por que não consegue parar? A resposta é simples! Marta não consegue parar para não pensar. Não consegue parar porque não pode pensar. “Não, não posso parar, se eu paro eu penso, se seu penso eu choro...” (A letra é de autoria de Marta.) Sair, correr, arrumar, reclamar... Tudo isso tem um significado, aponta na direção de armar defesas contra a angústia. Qualquer coisa, menos pensar. Essas defesas são infantis. E embora as angústias não se resolvam quando o adulto se defende delas, como fazia na infância, na maioria das vezes, é assim que ele continua fazendo. Quando a criança, enfastiada com o brinquedo ou a história, pergunta: O que é que a gente vai fazer agora?, ela, na verdade, está lançando as pontes por onde o sujeito vai passar em futuro bem próximo. “Fazer” é o verbo preferido das crianças. O verbo, adulto e satisfatório, será o verbo “pensar”. Mas pensa que é fácil?

O pensamento que Marta pensa, quando conversa com Jesus, não é pensamento. Aliás, o diálogo de Marta não é diálogo. Marta fala a fim de ouvir a própria voz. Marta se enreda na própria dor e emite frases desconexas. O diálogo entre ela e Jesus parece um diálogo de surdos. Eles se falam. Mas ninguém ouve o outro. Ambos perderam alguém querido. Ambos estão sufocados pela dor. A dor não deixa pensar. A dor prefere repetir, qualquer coisa, um movimento involuntário, mesmo que ele traga ainda mais dor. A dor repete qualquer coisa, para ver se a dor passa. Mas não passa. Enquanto repetir, não.

Marta repete duas vezes a expressão “eu sei”. Ela parece saber muitas coisas. Mas no fundo, não sabe nada e nem quer saber. Quem diz muito “eu sei”, será que sabe?

Marta só quer o irmão de volta. É só isso o que ela quer saber, é só isso o que ela sabe, é só isso o que ela quer. Mas, do que fez o irmão desandar, disso, ela nada quer saber. É provável que o que fez o irmão desbarrancar pela via da morte seja uma realidade que também atinja a ela e a sua irmã. Por isso, ela não quer saber nem ver. Marta se torna cega porque é surda. Não quer e não pode enxergar. Mas, o que ela não quer e nem pode, na verdade, é ouvir. Marta tem medo de ouvir seu mundo interno. Esse medo, que tudo paralisa, travou-a, cegou-a, ensurdeceu-a. Pobre Marta! O medo tomou conta dela: o medo de saber.

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