Falei, ali atrás, da “bela alma”, e esqueci-me de dizer que tudo se resume ao que uma amiga diz: “Todo hábito de freira esconde um espartilho vermelho”. A “bela alma” tenta esconder demônios preocupantes. Mas eles existem. E aí, quando ela vem para a análise, e a análise desperta esses demônios adormecidos, meu Deus, o que fazer?! Não era melhor que continuassem adormecidos? Depende. Depende de como o sujeito pretende que seja esse “adormecer”: uma porque demônio não dorme; outra, porque você não dorme; terceira, porque se o hábito de freira for branco, o espartilho vermelho vai aparecer. Ah, se vai!
Falo isso, porque, geralmente, na análise como na vida, não existe “bandido”. Só “mocinho”. Cada um traz no embornal a certeza de que ele é bom e o resto do mundo nem tanto assim. Lembro-me do papai quando dizia: Todo mundo é muito bonzinho, mas as minhas galinhas tão sumindo todas!
Então, o que a análise faz? Ela questiona o mocinho embutido no bandido. Será que a gente é mesmo assim tão mocinho quanto almeja parecer? Não será mais inteligente considerar que todo mocinho esconda um bandido, todo hábito de freira um espartilho vermelho?
Mas é tão complicado questionar o “mocinho”! Desvendar o espartilho sob o hábito, então, nem se fale!
Um sujeito, certa vez, me pediu que eu não lhe devolvesse apenas o que ele dissesse, que não só regurgitasse aquilo que ele havia falado, segundo ele, “que nem criança regurgita queijinho!” E completou: Se for para ficar apenas no “Ah! Que ruim que aconteceu isso com você”, então vamos pro bar, beber. No lugar do analista, dizia ele, se espera que o analista não fique perdido na cortina de fumaça do paciente! O analista tem de dizer “sim” se for sim, “não” se for não, e, às vezes, “siiimmm” e, às vezes, “nãããooo”!
Falo isso, porque não é raro o sujeito pegar a barda de se esconder atrás dos sintomas. “É a minha psoríase”, “é a minha depressão”, “é a minha ansiedade”, “é a minha enxaqueca”... Mas esses são os seus sintomas, falo sempre pro dono deles. Cadê você? Quem é você? O que o traz aqui? O que faz você viver? E o que o impede? Por que você não voa com asas que tem? Que dependência é essa de que o outro vá para você poder ir? Que dependência é essa de que o outro queira pra você poder querer? Por que se esconder tanto atrás de uma imagem se você nem sabe direito como ela é?
Entende?
Mais uma análise brilhante Renato,com certeza atras da bela imagem que aparentamos,mora um dragão adormecido...A questão é, se o Dragão acordar teremos força p/dominá-lo, eis a questão!
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